Talvez você nunca tenha ouvido falar na Nortec Química, mas é provável que ela esteja presente na sua vida. Responsável pela produção de princípios ativos de medicamentos que vão desde o Dorflex e a Neosaldina, remédios campeões de venda no País, até os antirretrovirais usados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) nos coquetéis ministrados a pacientes portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV), passando por anestésicos locais e drogas que combatem doenças negligenciadas, como o mal de Chagas e a filariose, a Nortec é um exemplo acabado da efetividade e de externalidades positivas da atuação de um banco público de desenvolvimento.
Fundada em dezembro de 1985, no distrito de Xerém, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, a empresa iniciou a parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em 2002, quando o banco de fomento, por meio da subsidiária BNDES Participações (BNDESPAR), aceitou o convite para investir no empreendimento, adquirindo uma participação de 20% no capital social da companhia. Maior fabricante de insumos farmacêuticos ativos da América do Sul, a Nortec Química faturou R$ 208 milhões no ano passado e conta hoje com um quadro de 274 funcionários, dos quais mais de 62% possuem diploma de graduação.
Com capacidade para produzir anualmente 340 toneladas de princípios ativos, a empresa tem hoje 248 clientes distribuídos em 46 países, entre fabricantes de medicamentos de marca e genéricos, além de laboratórios públicos. Graças à política de governança implementada pelo BNDES, a Nortec está listada no Bovespa Mais, segmento da B3 que busca fomentar o acesso de pequenas e médias empresas ao mercado de capitais, e se prepara para realizar sua primeira oferta pública de ações (IPO).
Desde 2005, o BNDES vem financiando a ampliação da capacidade produtiva da empresa e o desenvolvimento de novos produtos, somando R$ 64,3 milhões contratados até o mês passado. Dos 50 insumos farmacêuticos ativos que constituem o atual portfólio da Nortec, 27 contaram com apoio do banco de fomento. São analgésicos, antitérmicos, anti-inflamatórios, medicamentos para o sistema nervoso central, antivirais, broncodilatadores, descongestionantes, remédios para o coração e antialérgicos, entre outros.
“A Nortec é particularmente importante porque aqui estamos juntando duas coisas que nos são muito caras: inovação e produtos estratégicos para a saúde pública no Brasil”, afirma o chefe do Departamento do Complexo Industrial e de Serviços da Saúde do BNDES, João Paulo Pieroni. “No caso da BNDESPAR, esse trabalho tem muito a nossa impressão digital, a nossa cara: a gente participa do processo de tornar a empresa mais profissional”, acrescenta o gerente Gabriel Biscaia, da Área de Gestão de Participações do banco de fomento.
Conforme lembrou a gerente Márcia Lousada, também do Departamento do Complexo Industrial e de Serviços da Saúde, a Nortec vem participando de vários projetos de desenvolvimento de insumos farmacêuticos ativos para serem produzidos pelo governo a menor custo. “É um agente importante na política do Ministério da Saúde de internalizar no País a produção desses medicamentos, que são importantes por serem escassos ou ter custo de importação elevado”, pondera.
Na avaliação do contador Leonardo Gonzaga, da Área de Gestão de Participações do BNDES, os projetos que a empresa se propõe a realizar seguem à risca o planejado e saem bem-feitos. “Eles fazem muito bem o dever de casa”, resume.
Laboratório de pesquisa e desenvolvimento da Nortec Química
Histórico – A Nortec surgiu no início da década de 80 por meio de um convênio de cooperação tecnológica entre a Nordeste Química SA (Norquisa), cujo conselho de administração tinha na presidência o general Ernesto Geisel, e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), então presidida pelo médico sanitarista Sérgio Arouca, para fazer no País uma indústria autóctone de produção de insumos farmacêuticos. “Começamos por anestésicos locais: fizemos a primeira e a segunda fábricas”, conta o presidente do conselho da Nortec Química, Alberto Mansur.
Segundo o conselheiro, a terceira, a quarta e a quinta fábricas só foram construídas graças ao BNDES. “Fomos ao BNDES porque a gente aprende na Escola Superior de Guerra (ESG) que esse tipo de ativo tem de ter a participação do governo, porque é lá que tem intelectualidade”, afirma. “O BNDES apôs na Nortec conhecimento, governança e gestão, e falou: ‘Vocês vão ser uma empesa auditada e abrir o capital’. Por influência do BNDES e conhecimento de engenharia química, temos cinco fábricas independentes”.
Mansur ressalta que a empresa foge do modelo chinês de fábricas mantidas a baixo custo. “Mantemos as cinco plantas inertizadas com nitrogênio, com dois engenheiros químicos por turno, e nos honramos de a maioria dos empregados formada basicamente em engenharia química com recursos da Nortec Química”, orgulha-se. “Se a gente colocasse aqui um sócio financeiro ganhador de dinheiro, não haveria nada disso, nem capacidade de pesquisa e desenvolvimento. Como engenheiro químico, me honro de dizer que, em 34 anos de operação, nunca tivemos um acidente irreversível, porque temos nitrogênio”.
“É a única no Brasil e a maior da América Latina no segmento, com similares apenas na Alemanha, na Itália, nos EUA e no Japão”
– Alberto Mansur, presidente do conselho de administração da Nortec
Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), administrador de empresas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e conferencista convidado do Massachussets Iunstitute of Technology (MIT), do Instituto Militar de Engenharia (IME) e da ESG, o presidente do conselho considera a Nortec a empresa de maior densidade tecnológica de todo o setor industrial brasileiro. “É a única no Brasil e a maior da América Latina no segmento, com similares apenas na Alemanha, na Itália, nos EUA e no Japão”, ressalta. “Dentro da química fina, produz as moléculas ativas que curam. Não é empresa que mistura e vende em farmácia”.
De acordo com Alberto Mansur, a indústria é a mais densa porque parte de derivados tóxicos e cancerígenos da gasolina, como benzeno, tolueno e xilenos, para produzir anestésicos e tranquilizantes como clonazepan (Rivotril) e midazolam (Dormonid). “Sem a Nortec Química, não há odontologia no País, não há ambulatórios, não há cirurgia, nem há programa antiaids, porque toda a produção de antirretrovirais para HIV vem da Nortec”, garante. “Para a aids, a base não vem da gasolina do petróleo, vem da sacarose, o açúcar comum”. A tecnologia para a produção de tranquilizantes foi adquirida em 2002, com a aquisição de uma fábrica da Roche em São Paulo.
A Nortec Química é a única produtora no mundo de propiltiouracil, para quem sofre da tireoide, e de benzonidazol, para doença de Chagas. É também a única produtora no mundo de tiabendazol em grau farmacêutico, contra fungos e outros parasitas que atacam a pele. Produz também dicloroetilamina, para filariose. Outro produto de destaque da empresa é a espironolactona, que vem da fermentação da soja, o fármaco mais importante para uso cardiológico.
Marcelo Mansur, vice-presidente executivo, e Alberto Mansur, presidente do CA da Nortec
Tratamento isonômico – Na avaliação do presidente do conselho administrativo da Nortec, sem a empresa, não haveria um mercado de medicamentos genéricos no País, pois ela vende igualmente para todos os fabricantes. “Daí a razão, creio, de o BNDES ser sócio desde 2002: sem a Nortec, não há equilíbrio no mercado farmacêutico, nem na parte tecnológica”, argumenta. “Jamais a engenharia ensinou o que a Nortec faz, por isso temos a Universidade Nortec aos sábados, porque eu, como professor universitário, jamais poderia ensinar, dentro da engenharia química no Brasil, o que se faz aqui”.
A Fiocruz se baseia na Nortec em seu plano de saúde. “Não produzimos só para lucro, produzimos para o SUS e somos lucrativos porque temos boas tecnologias: são mais de 40 produtos e mais de 120 tecnologias”, resume Mansur. “Estamos entrando agora na área de oncológicos, construindo a sexta planta com financiamento de R$ 32 milhões do BNDES e R$ 30 milhões da Finep. O Brasil importa todas as drogas anticâncer já formuladas e finais. Faremos a molécula ativa, que vem ou do açúcar ou da soja”.
Maior produtora mundial de anestésicos locais, como a lidocaína (xilocaína), a Nortec conquistou certificação da Food and Drug Administration (FDA) e já está explorando esse nicho dos EUA. “Vamos entrar com outros produtos naquele mercado”, anuncia Mansur. “Numa reunião no BNDES, em 2012, a então presidente da Organização Mundial da Saúde (OMS), Margareth Chan, disse: ‘A Nortec Química é essencial para a saúde pública no Brasil e no mundo. Parabéns ao BNDES por ser sócio’”, lembrou Mansur.
Fonte: https://pfarma.com.br/noticia-setor-farmaceutico/mercado/4185-nortec-quimico-farmaceutica.html